06/07/2005

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Reação dos reacionários

O conservadorismo das posições conquistadas, segundo o "discurso da competência", dependeria da ambição (ou da arrogância) de se acreditar superior aos outros ("por se dizer mais competente, eficaz e sério") em uma sociedade de desiguais.<br /> <br /> Para a ideologia de direita, como os homens são seres biológicos desiguais, devem submeter-se à "lei do darwinismo social". O que define uma posição de direita é a idéia de que a vida em sociedade reproduz a vida natural. A economia de mercado não faz uma seleção, neste caso "social", entre os indivíduos que podem se desenvolver e os que podem apenas sobreviver?<br /> <br /> A regra de ouro da direita é: quem melhor se adapta ao meio ambiente econômico enriquece, inclusive dando continuidade a sua dinastia. O homem de direita, acima de tudo, preocupa-se com a defesa da tradição e da herança.<br /> <br /> Uma atitude de esquerda pressupõe a negação da herança "natural". A sociedade se desenvolve, opondo-se às forças cegas da natureza. Quem acredita na essência humana como essencialmente egoísta e imutável é de direita, mesmo sem saber.<br /> <br /> A direita acredita que as desigualdades sociais podem ser diminuídas à medida que se favoreça a competitividade geral. Minimiza a proteção social e maximiza o esforço individual.<br /> <br /> A esquerda, por sua vez, prioriza a proteção contra a competição social. Na escolha entre a competitividade e a solidariedade, prioriza esta última.<br /> <br /> Assim, são de esquerda as pessoas e os partidos políticos que reúnem essas pessoas em torno de uma ação coletiva que batalha pela eliminação das desigualdades sociais.<br /> <br /> Diferentemente, a direita insiste na convicção de que as desigualdades são naturais e, enquanto tal, não são passíveis de serem eliminadas.<br /> <br /> Podemos tomar como exemplos dessa clivagem ideológica as críticas ao governo Lula. A esquerda (partidária ou acadêmica) sem base social critica, em geral, "o tratamento insuficiente de projetos para a transformação da sociedade, tornando-se agente funcional da dinâmica do capital com a continuidade da política econômica do governo Fernando Henrique Cardoso".<br /> <br /> E a crítica moralista de direita, geralmente, utiliza-se dos jargões da "traição da classe (e de suas bases partidárias)", devido à ambição pessoal pela "mordomia dos cargos", para desqualificar moralmente o governo Lula.<br /> <br /> O temor dos conservadores de tudo perder, em razão dos avanços sociais e econômicos, produz uma ansiedade exponencial pela obsessiva apresentação, pela mídia, das realizações governamentais como uma série de calamidades.<br /> <br /> Então, a direita diz: "Só faltava a chegada do PT ao poder para ele tornar-se igual aos outros; por isso, o jogo para 2006 está zerado, não há diferença entre o PT e a oposição e o pêndulo da política deve levar à vitória dos derrotados em 2002". Diz mais: "Não há por que acreditar que o PT seja partido ideológico diferenciado eticamente em relação aos demais. No poder, tem os mesmos defeitos dos outros".<br /> <br /> São dois tipos de ilustração usual dessas críticas. Uma cita os defeitos pessoais de alguns membros do governo (ou do PT) para, implicitamente, generalizar a todos os outros "colegas" ou "companheiros". Não é justo condenar todos por atitudes condenadas (e punidas) de alguns poucos.<br /> <br /> Da mesma forma, condenar alguns programas sociais que conseguem sucesso em 99% de suas ações, em razão de 1% de seus desvios, não é correto. Apontar também problemas históricos das instituições brasileiras que não foram ainda resolvidos no atual governo é ato de má-fé.<br /> <br /> Mas o debate pré-eleitoral vai ficando mais claro quando aparecem os interesses econômicos. Esquerda e direita possuem contrastes não só de idéias, mas também de interesses econômicos e de prioridades a respeito da direção a ser seguida pela sociedade.<br /> <br /> Quando a crítica central se dirige para "o excesso de gastos públicos" ou "a elevada carga tributária", a reação dos reacionários fica transparente. Gastos sociais visam um Estado de Bem-Estar Social e são geradores de emprego. O problema não é o fato de eles crescerem, mas sim de não serem financiados de forma adequada.<br /> <br /> Agora, a reação conservadora é forte justamente quando se faz uma arrecadação fiscal progressiva (ricos pagam mais que pobres) e uma pressão crescente sobre os sonegadores, sobre as pessoas físicas camufladas em pessoas jurídicas, sobre os mais beneficiados com o crescimento da renda etc.<br /> <br /> Essa é a forma que a esquerda adota para realizar o programa com que ganhou as eleições presidenciais: crescimento com desconcentração de renda. Aliás, não há outra forma democrática capaz de superar a maior vergonha nacional, ou seja, a desigualdade social: gastar com os mais pobres com tributos pagos pelos mais ricos.<br /> <br /> <br /> Artigo publicado no dia (29/06) no jornal Folha de S.Paulo.