24/04/2025

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Em artigo exclusivo, líder do governo na Câmara defende regulação das plataformas digitais

A terra de ninguém que são as redes sociais está cada vez mais perigosa. De crianças e adolescentes que são vítimas de criminosos manipuladores, causadores de danos psicológicos e até mortes, a estrategistas políticos transnacionais, que disseminam fake news para influenciar em eleições, há todo tipo de delinquente no ambiente virtual.

As big techs são permissivas ou cúmplices desses delitos e se eximem de qualquer responsabilidade. Nessa blindagem, acabam beneficiadas pelo vácuo na legislação brasileira, que não saiu dos tempos analógicos.

A necessidade urgente de atualização das leis nacionais quase foi suprida pelo Congresso, que chegou a esboçar a criação de um projeto para regulação das plataformas digitais e responsabilização das big techs.

No entano, o lobby das gigantes internacionais venceu: Arthur Lira, então presidente da Câmara, engavetou o texto preliminar elaborado pelo deputado Orlando Silva (PCdoBSP) e desde então nada foi feito.

Tragédias recentes originadas nas redes sociais, como a morte de uma menina de sete anos que participou de um desafio suicida na internet, têm chamado a atenção da opinião pública. O Brasil está perplexo diante do efeito deletério das telas e telinhas.

Para o líder do governo na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE), já passou da hora de os políticos intervirem para impedir que interesses de grandes conglomerados econômicos internacionais se sobreponham  ao bem estar dos usuários das plataformas digitais.

“O fato é que as redes sociais precisam ser transformadas num lugar de harmonia social, da cidadania e da democracia”, escreve ele, em artigo exclusivo para o ICL Notícias.

A seguir, a íntegra do texto de José Guimaães: 

O Brasil precisa de uma lei para plataformas digitais, como fizeram grandes nações

Por José Guimarães*

O Brasil tem sofrido abalos cada vez mais frequentes com tragédias envolvendo crianças e adolescentes, ocorridas a partir das redes sociais e de aplicativos de mensagens usados para disseminar conteúdos de extremismo, de manipulação, de ódio, de exposição não permitida, de incentivo à automutilação e ao suicídio de pessoas vulneráveis. Dados da Secretaria de Direitos Humanos do Ministério da Justiça revelam que ao menos 56 crianças morreram vítimas de desafios online nos últimos 12 anos. O caso mais recente foi o da menina Sarah Raíssa, de sete anos, que morreu depois de inalar desodorante, em Brasília, para cumprir ordem de um desafio.

A escalada da violência no ambiente digital ganha proporções assombrosas e nos coloca em uma situação na qual vamos ter que escolher: civilização ou barbárie. As plataformas digitais alimentaram expectativas de que seriam avenidas de liberdade para consolidação da democracia. Porém, o que estamos vendo é o ambiente digital transformado num território sem lei, numa ameaça global aos direitos humanos garantidos pelo Estado democrático de direito.

A democracia está ameaçada por uma lógica de negócios predatória, de predomínio absoluto dos interesses privados em detrimento do interesse público. Os clicks no meio digital giram as rodas das fortunas dos impérios dominados por oligarcas bilionários, com poderes talvez maiores que os dos chefes de Estado. Enquanto o tecido social é esgarçado com a propagação de desinformação e da violência pelo crime organizado.

Eleições estão sendo manipuladas por estruturas políticas gigantescas, em certos casos, dirigidas por pessoas inescrupulosas, com utilização de sofisticadas técnicas de comunicação sustentadas por métodos de desinformação para domínio da opinião pública.

Em 2018, tivemos eleições no Brasil da qual participou um candidato que fez sua campanha utilizando deliberadamente de métodos de desinformação e pregação explícita de violência, com a conivência das plataformas digitais transnacionais que, por sua vez, não demonstram compromisso com a democracia. Outros países passaram ou estão passando por situação semelhante, com repercussão global. Muitos deles debatendo ou já dispõem de leis que regulamentam o convívio social no meio digital com a instituição do dever de cuidado para as big techs.

Dada a gravidade dos problemas que estão acontecendo nas redes, responsabilizar as plataformas pela veiculação de conteúdos criminosos – como os demais meios de comunicação são responsabilizados – é um dever do Estado. A situação tem ultrapassado os limites do razoável e exigido providências governamentais para preservação dos direitos humanos e da harmonia social.

A disseminação do ódio nas redes, associada à facilitação do acesso a armas no Brasil, encontrou lugar nas plataformas digitais, que têm servido de abrigo para o crime organizado. Multiplicou os índices de violência, da letalidade, de feminicídios, homofobia, racismo, crimes de ódio, políticos, contra crianças e adolescentes, entre outros crimes, conflitos generalizados e insegurança na sociedade brasileira. Recentemente, o Ministério da Justiça identificou mais de 80 facções criminosas no Brasil, que usam as redes sociais para a prática de crimes.

A difusão do neonazismo, por exemplo, condenado mundialmente – tornado crime em vários países – também encontrou lugar nas plataformas digitais, com apologia explícita e incitação direcionada a jovens nas redes sociais. Segundo a antropóloga Adriana Dias, professora e pesquisadora da Universidade Estadual de Campinas, em três anos, considerando os anos de 2018 a 2021, houve um crescimento de 270%, de grupos neonazistas no Brasil, com expansão para as cinco regiões do país. Já são mais de 530 núcleos extremistas, com mais de 10 mil pessoas, que se comunicam pelas redes sociais fazendo apologia ao nazismo e incitando à violência.

A União Europeia já aprovou lei que responsabiliza as plataformas pela veiculação de conteúdos e instituiu o dever de cuidado baseado na lei da Alemanha, considerada uma lei severa. Austrália, Canadá, Estados Unidos, entre outros países, também seguem o mesmo caminho, debatendo e votando leis que possam proteger a sociedade e preservar a democracia, assegurando o direito à informação correta e o dever das empresas de respeitarem os direitos humanos.

Os direitos autorais são outro aspecto que precisa ser debatido. Não é razoável a veiculação de conteúdos musicais, audiovisuais e editoriais nas redes, sem o devido reconhecimento de propriedade e remuneração pelas plataformas. Se são todos meios pertencentes a empresas que lucram com a exposição e o compartilhamento, os conteúdos terão que ser devidamente pagos. A negação do pagamento explica, em grande parte, os extraordinários lucros das big techs. Precisamos debater a isonomia entre os meios de comunicação, nesse aspecto.

Ilegalidades na atuação empresarial no meio digital, abuso do domínio econômico, entre outras, estão sendo enfrentadas em todos os continentes, devido às ameaças que representam aos direitos humanos e à democracia.

Autoridades representativas do poder público se movimentam mundo afora, a fim de garantir regras para o funcionamento dos serviços prestados pelas plataformas digitais. Independentemente do ramo de atividade e transnacionalidade, empresas estrangeiras são sujeitas às leis de cada país. As plataformas digitais que atuam no Brasil são sujeitas às leis brasileiras como as demais empresas estrangeiras.

Aqui, o debate sobre a regulamentação da atuação das big techs foi suspenso. A escalada da violência e da criminalidade, em grande parte originária no ambiente digital, tem causado clamor público por providências dos agentes do Estado. O ideal seria elaborar as regras em parceria com as plataformas digitais, mas o interesse privado não combina com o interesse público. O fato é que as redes sociais precisam ser transformadas num lugar de harmonia social, da cidadania e da democracia. Essa é nossa utopia e a pauta desse momento sob responsabilidade do Congresso Nacional.

 

* Advogado, deputado federal, PT–CE, e líder do Governo na Câmara dos Deputados.

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