25/08/2017

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Artigo - Brasil: quanto custa a soberania?

Quarenta e quatro bilhões. É o quanto vale o Brasil para o governo ilegítimo. Seu pacote de privatizações tem coragem de prever a venda até da Casa da Moeda. Sim, a Casa da Moeda. Uma das instituições mais antigas e respeitadas do País, criada ainda no Império, em 1694, e hoje uma das únicas empresas do mundo a dominar a tecnologia para a confecção não só de dinheiro, mas de passaportes e selos fiscais. Um símbolo da soberania nacional. E isso não é tudo. O governo pretende vender ainda o controle dos nossos recursos hídricos, com a privatização da Eletrobras.

Apesar do absurdo que esses dois fatos representam, o pacote de Michel Temer não para por aí. A intenção é vender na bacia das almas 57 empresas e serviços hoje sob controle do Estado, muitos deles estratégicos para o Brasil. É o caso da Eletrobras. Com a privatização da estatal, o governo pretende arrecadar 20 bilhões de reais. Um troco para uma empresa que conta com 114 termelétricas, 47 hidrelétricas, 69 usinas eólicas e gera mais de 47 mil megawatts de energia.

Mais importante do que esse serviço prestado, é o papel estratégico de regular a geração de energia elétrica no País, principalmente se considerarmos que praticamente toda a energia brasileira tem geração hídrica, de baixo custo de geração e com pouco impacto ambiental.

Todos sabem que a nova fronteira do desenvolvimento, e mesmo da manutenção do padrão civilizatório atual, depende da geração de energia renovável, exatamente o caso da produção brasileira. Por isso a ânsia da iniciativa privada em controlar esse mercado. E esse governo, claro, está muito disposto a, mais uma vez, prestar seus serviços a quem controla o capital.

A cada dia fica mais claro que não foi por acaso que se perpetrou um golpe de Estado contra uma presidente honesta e legitimamente eleita. O que estava em jogo naquele momento, e continua em disputa agora, era a soberania do Brasil. É claro que o “deus mercado” não poderia permitir que um país periférico no capitalismo continuasse a deter o controle absoluto de suas reservas naturais – como água e petróleo – e, desta forma, fazer frente a interesses privados poderosos.

Não por acaso, a primeira medida aprovada após a chegada de Temer ao poder foi a mudança do regime de exploração do pré-sal. Pelo regime de partilha, quem decide quando e como explorar as reservas é o Estado. Claro que não poderia continuar assim. Por isso alteraram novamente a legislação para transferir essa decisão ao mercado. Com o regime de concessão, o governo até arrecada uma parte do lucro, mas fica fora das decisões estratégicas a respeito da gestão de uma de suas maiores fontes de riqueza.

E agora o governo pretende entregar o outro bem que hoje é o mais disputado no mundo, inclusive em guerras, o controle das nossas águas. Sim, pois a privatização da Eletrobras nada mais significa do que entregar ao mercado a gestão dos nossos recursos hídricos, uma vez que, como foi dito, a quase totalidade da energia consumida no Brasil vem dos rios.

O servilismo não tem limites. E o governo quer repassar também o controle do nosso espaço aéreo. Parece inacreditável. O pacote de privatizações prevê a concessão à inciativa privada do Departamento de Controle do Espaço Aéreo (Decea). Em qualquer lugar do mundo, o controle do espaço aéreo é considerado item sagrado da soberania. Por isso, não basta vender os aeroportos, inclusive os mais lucrativos, até porque está claro que não é disso que se trata, é preciso vender tudo que resta da nossa soberania.

Em nome de equilibrar as contas públicas, esse governo vende o País, e por um valor que sequer chega perto de cobrir as benesses que ele mesmo concede ao “andar de cima”. Basta lembrar que cálculos da Receita Federal e da Controladoria da União mostram que apenas com o programa de refinanciamento de dívidas (Refis), sempre de grandes devedores, claro, o Tesouro vai perder mais de 220 bilhões de reais até 2020. Portanto, fica cada vez mais patente que o discurso da austeridade não passa de um mal disfarce para a venda pura e simples do Brasil. E por um trocado.

José Guimarães, Advogado, deputado federal (PT-CE), líder da oposição na Câmara
Artigo publicado na Revista Carta Capital - 25/08/2017